DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL AFASTA SERVIDOR SOBRINHO DE VEREADOR NOMEADO EM CARGO COMISSIONADO NA PREFEITURA DE CRISTAIS PAULISTA
1. Trata-se
de reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Ministério Público
do Estado de São Paulo, com fundamento nos arts. 103-A, § 3º, da Constituição
Federal e 13 a 18 da Lei 8.038/90, e no Ato Normativo 574/2009, da
Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, contra ato do Prefeito do
Município de Cristais Paulista consubstanciado na nomeação de Benedito José de
Souza Neto para o cargo de provimento em comissão de Diretor de Planejamento
Territorial, que afrontaria o disposto na Súmula Vinculante 13, do Supremo
Tribunal Federal.
Relata
o MP paulista que o alegado vício se deu em razão do vínculo de parentesco
existente, uma vez que o Diretor de Planejamento Territorial é sobrinho do
Vereador José Lourenço da Silva.
Enfatiza
também que, não obstante a recomendação para cessação da situação ofensiva à
Súmula Vinculante 13, o Município defendeu a legalidade do ato sob o fundamento
de que não há relação de parentesco do Chefe do Poder Executivo com o agente
nomeado, que o vínculo de parentesco com vereador não é proibido e que o
servidor já exerce cargo comissionado mesmo antes da diplomação e exercício de
seu tio na Câmara Municipal.
Ressalta
a irrelevância das nomeações anteriores, dada a natureza de investidura originária
de nomeação para cargo comissionado.
Aduz
que o Decreto 1.937, de 10 de agosto de 2009, de nomeação de Benedito José de
Souza Neto no cargo comissionado de Diretor de Planejamento Territorial, é
posterior ao início do exercício do mandato de José Lourenço da Silva na Câmara
Municipal, que ocorreu em 1º de janeiro de 2009, independentemente das
nomeações e das exonerações ocorridas anteriormente para cargo diverso.
Aponta
que a nomeação em cargos de provimento em comissão ou funções de confiança de
parentes até o terceiro grau da autoridade nomeante ou de agentes públicos
investidos em cargos de assessoramento, chefia e direção na mesma pessoa
jurídica é inadmissível diante dos princípios da moralidade e da impessoalidade
na Administração Pública, afirmação corporificada pela vedação da Súmula
Vinculante 13, que alcança parente de vereador nomeado para cargo no Poder
Executivo, pouco importando a sua investidura em cargos de natureza política ou
nomeação de parente de chefe do Executivo em cargo comissionado no Legislativo.
Requer,
ao final, a concessão de medida liminar, a fim de suspender a eficácia do ato de nomeação de
Benedito José de Souza Neto em cargo comissionado na Prefeitura de Cristais
Paulista, bem como para impedir a sua nomeação para outros cargos de provimento
em comissão enquanto presente a situação de nepotismo vedada, até o julgamento
final desta reclamação. No mérito, pede a
anulação do ato administrativo de investidura no cargo em comissão
anteriormente descrito.
2. Inicialmente,
diante da suposta ilegitimidade do Ministério Público do Estado de São Paulo
para deduzir, em defesa da ordem jurídica, pretensão originária perante o
Supremo Tribunal Federal, nos termos dos arts. 103, § 1º, da Constituição
Federal e 156 do RISTF, intimei o Senhor Procurador-Geral da República para
ratificar ou não o pedido formulado pelo MPSP, o que foi feito mediante a
Petição STF 18.383/2011, quando, então, restituiu os autos para o
prosseguimento da demanda, em virtude do reconhecimento, pelo Plenário desta
Corte, da legitimidade do Ministério Público Estadual para propor reclamação
perante o Supremo Tribunal Federal.
3. Instada
a se manifestar, a autoridade reclamada prestou informações, por meio da
Petição STF 40.400/2011.
Sustentou,
preliminarmente, a ilegitimidade ativa do representante do parquet estadual para propor reclamação perante a Suprema Corte.
Quanto
ao mérito, defende a legalidade da nomeação do agente público, dada a
inexistência de relação de parentesco entre a autoridade nomeante (chefe do
Poder Executivo) e o servidor nomeado em razão de sua capacidade laboral, em
momento anterior à eleição e posse do seu tio para o cargo eletivo de vereador
(membro do Poder Legislativo).
4. Vislumbro, neste juízo prévio, o
confronto entre o ato impugnado e o que dispõe a Súmula
Vinculante 13:
“A nomeação de
cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até
o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma
pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o
exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada
na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da união,
dos estados, do distrito federal e dos municípios, compreendido o ajuste
mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal” (DOU
29.8.2008).
O
Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido da necessidade de
verificação da natureza do cargo a ser ocupado, pois, se de natureza política,
não há que falar em conotação de nepotismo; entretanto, se de natureza
administrativa, incide o comando da Súmula Vinculante 13 (Reclamação
6.650-MC-AgR/PR e Recurso Extraordinário 579.951/RN).
Ressalte-se
que, no julgamento do Recurso Extraordinário 579.951/RN, de minha relatoria, o
Plenário desta Suprema Corte enfrentou situação semelhante à presente, pois,
fazendo distinção entre cargo estritamente administrativo e cargo político,
considerou hígida a nomeação do agente político ocupante do cargo de Secretário
Municipal de Saúde, em especial por não ter ficado evidenciada a prática do
nepotismo cruzado; entretanto, declarou nulo o ato de nomeação do motorista.
Nesse aspecto, acompanhei o entendimento da douta maioria.
Naquela
ocasião, ressaltei o seguinte em meu voto:
“A Constituição de
1988, em seu art. 37, caput,
preceitua que a Administração Pública rege-se por princípios destinados a
resguardar o interesse público na tutela dos bens da coletividade.
Esses princípios, dentre os quais destaco o da
moralidade e o da impessoalidade, exigem que o agente público paute a sua
conduta por padrões éticos que têm como fim último lograr a consecução do bem
comum, seja qual for a esfera de poder ou o nível político-administrativo da
Federação em que atue.
Nesse contexto,
verifica-se que o legislador constituinte originário, bem assim o derivado,
especialmente a partir do advento da Emenda Constitucional 19/1998, que levou a
cabo a chamada 'Reforma Administrativa', instituiu balizas de natureza cogente
para coibir quaisquer práticas, por parte dos administradores públicos que, de
alguma forma, pudessem buscar finalidade diversa do interesse público. Uma
dessas práticas, não é demais repisar, consiste na nomeação de parentes para
cargos em comissão ou de confiança, segundo uma interpretação equivocada ou,
até mesmo, abusiva dos incisos II e V, do art. 37 da Constituição”.
O
que caracterizaria a natureza do cargo político é o vínculo que o agente mantém
com o Estado. Se esse for de natureza política, e não profissional, ou seja, se
exerce um múnus público e conduz os
destinos da sociedade, podemos afirmar que estarmo diante de um cargo de
natureza política, que deve ser desempenhado por um agente político.
Segundo
Celso Antônio Bandeira de Mello, os agentes políticos são aqueles ocupantes de
cargos que integram o arcabouço constitucional do Estado. Nas palavras do
autor:
“São agentes
políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e
respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes de Executivo, isto é,
Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados
federais e estaduais e os vereadores”.
"Diretor de Secretaria Municipal , Estadual ou Federal tem cunho administrativo e não tem Múnus de agente político , sendo assim toda nomeação em cargo comissionado gera nepotismo"
A
situação do interessado se subsume, a princípio, ao que expressamente dispõe a
Súmula Vinculante 13, o que evidencia a fumaça do bom direito.
5. Ante
o exposto, defiro o pedido de medida
liminar para suspender a eficácia do
ato de nomeação de Benedito José de Souza Neto
para o cargo de provimento em comissão na Prefeitura Municipal de
Cristais Paulista/SP, até o julgamento final desta reclamação.
Comunique-se
esta decisão ao Prefeito do Município de Cristais Paulista/SP.
Publique-se.
Após,
abra-se vista à Procuradoria-Geral da República (arts. 103, § 1º, da Constituição
Federal; 16 da Lei 8.038/1990; e 160 do RISTF).
Brasília,
5 de agosto de 2011.
Ministra Ellen Gracie
Relatora
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