Publicado por Flávia T. Ortega - 20 horas atrás
1) Natureza cível da ação de improbidade
A ação de improbidade administrativa possui natureza cível. Em outras palavras, é uma ação civil e não uma ação penal.NÃO existe foro por prerrogativa de função no caso de ações cíveis, pois, em regra, somente existe foro por prerrogativa de função no caso de ações penais e não em demandas cíveis. Assim, por exemplo, se for proposta uma ação penal contra um Deputado Federal, esta deverá ser ajuizada no STF.
Vale lembrar que existe essa diferença porque a Constituição assim idealizou o sistema. Com efeito, as competências do STF e do STJ foram previstas pela CF/88 de forma expressa e taxativa.
No arts. 102 e 105 da CF/88, que preveem as competências do STF e do STJ, existe a previsão de que as ações penais contra determinadas autoridades serão julgadas por esses Tribunais. Não há, contudo, nenhuma regra que diga que as ações de improbidade serão julgadas pelo STF e STJ.
2) Lei n.º 10.628/2012 previu foro por prerrogativa de função para a ação de improbidade:
Em 24/12/2002, foi editada a Lei n.º 10.628, que acrescentou o § 2º ao art. 84 do CPP, prevendo foro por prerrogativa de função para as ações de improbidade. Veja:Art. 84. A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade.
(...) § 2º A ação de improbidade, de que trata a Lei n.º 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1º.
3) ADI 2797
Diante dessa alteração legislativa, foi proposta a ADI 2797 contra a Lei n.º 10.628/2002 e o STF julgou inconstitucional o referido § 2º do art. 84 do CPP, decisão proferida em 15/09/2005.O Supremo decidiu que “no plano federal, as hipóteses de competência cível ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da República ou dela implicitamente decorrentes. (...) Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal - salvo as hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III -, reservou explicitamente às Constituições dos Estados-membros a definição da competência dos seus tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal ordinária.” (ADI 2797, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, julgado em 15/09/2005).
Em suma, o STF afirmou que, como a Constituição não estabeleceu foro por prerrogativa de função para as ações de improbidade administrativa, a lei ordinária não poderia prever.
Desse modo, com a decisão da ADI 2797, ficou prevalecendo o entendimento de que as ações de improbidade administrativa deveriam ser julgadas em 1ª instância.
4) Reclamação 2138/DF: agentes políticos sujeitos aos crimes de responsabilidade da Lei n.º 1.079/50 não respondem por improbidade administrativa
O MPF ajuizou uma ação de improbidade administrativa contra um Ministro de Estado. A ação foi proposta na Justiça Federal de 1ª instância, que condenou o Ministro à perda do cargo e à suspensão de seus direitos políticos. Diante dessa decisão, o requerido ingressou com uma reclamação no STF formulando a seguinte tese: O Ministro de Estado é um agente político e os agentes políticos já respondem por crimes de responsabilidade, previstos na Lei n.º 1.079/50. As condutas previstas na Lei de improbidade administrativa em muito se assemelham aos crimes de responsabilidade trazidos pela Lei n.º 1.079/50. Logo, caso os agentes políticos respondessem também por improbidade administrativa, haveria bis in idem.Nessa ocasião, o STF acolheu a tese? SIM. O STF decidiu que a Lei de Improbidade Administrativa não se aplica aos agentes políticos quando a conduta praticada já for prevista como crime de responsabilidade (Lei n.º 1.079/50).
O STF entendeu que punir o agente político por improbidade administrativa e por crime de responsabilidade seria bis in idem e que deveria ser aplicada apenas a Lei n.º 1.079/50, por ser mais específica (princípio da especialidade).
A Lei n.º 1.079/50 prevê crimes de responsabilidade para os seguintes agentes políticos:
1) Presidente da República;
2) Ministros de Estado;
3) Procurador-Geral da República;
4) Ministros do STF;
5) Governadores;
6) Secretários de Estado.
Segundo decidiu o STF na ocasião, para que o agente político não responda por improbidade administrativa é necessário o preenchimento de duas condições:
a) Esse agente político deverá ser uma das autoridades sujeitas à Lei n. 1.079/50;
b) O fato por ele praticado deverá ser previsto como improbidade administrativa e também como crime de responsabilidade.
5) Pet 3211/DF: a competência para julgar ação de improbidade administrativa proposta contra Ministro do STF é do próprio STF
O MPF ajuizou uma ação de improbidade administrativa contra o Min. Gilmar Mendes, questionando atos por ele praticados na época em que foi Advogado Geral da União. A ação foi proposta na Justiça Federal de 1ª instância. Como o requerido era Ministro do STF, iniciou-se uma discussão sobre de quem seria a competência para julgar a causa. O STF decidiu, então, que a competência para julgar uma ação de improbidade contra um dos Ministros do Supremo seria do próprio Tribunal (Pet 3211 QO, Relator p/ Acórdão Min. Menezes Direito, Tribunal Pleno, julgado em 13/03/2008).6) Rcl 2.790/SC: a Corte Especial do STJ, no julgamento dessa reclamação, chegou a duas conclusões importantes:
a) Os agentes políticos se submetem à Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), com exceção do Presidente da Republica.b) Existe foro por prerrogativa de função nas ações de improbidade administrativa.
a) Agentes políticos se submetem à Lei de Improbidade Administrativa
O STJ discordou do entendimento do STF manifestado na Reclamação 2138/DF e afirmou que os agentes políticos respondem sim por improbidade administrativa, com exceção do Presidente da República.
b) Foro por prerrogativa de função nas ações de improbidade
Outra conclusão do julgado foi a de que seria possível o foro por prerrogativa de função nas ações de improbidade administrativa.
Assim, segundo foi decidido, o STJ possuiria competência implícita para julgar as ações de improbidade administrativa propostas contra os agentes públicos que estivessem sob sua jurisdição penal originária.
Em outros termos, concluiu-se que, se a autoridade tivesse foro privativo no STJ em matéria criminal, teria também a prerrogativa de ser julgado no STJ em caso de ação de improbidade.
7) Caso seja provocado, o Plenário do STF manterá o mesmo entendimento manifestado na Reclamação 2138/DF (julgada em 2007)?
Provavelmente não. Essa é a análise feita pelos estudiosos que analisam a jurisprudência do STF, sendo também a previsão realizada pela Corte Especial do STJ (AgRg na Rcl 12.514-MT).Essa previsão é baseada em decisões monocráticas já proferidas pelos Ministros, negando que os agentes políticos tenham foro por prerrogativa de função no STF para as ações de improbidade administrativa.
O Ministro Ari Pargendler, do STJ, em voto no qual faz um belo estudo sobre o tema acima exposto, afirma textualmente:
“Salvo melhor juízo, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Reclamação nº 2.138, DF, constituiu um episódio isolado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, e tudo leva crer que não se repetirá à vista de sua nova composição.” (AgRg na Rcl 12.514-MT, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 16/9/2013).Desse modo, existe uma tendência de que o Plenário do STF, se novamente provocado, decida que as ações de improbidade contra autoridades com foro por prerrogativa de função sejam julgadas em 1ª instância e não no STF.
8) AgRg na Rcl 12.514-MT: o STJ volta atrás e solidifica o entendimento de que NÃO existe foro por prerrogativa de função em ações de improbidade administrativa mesmo se propostas contra agentes políticos que são julgados penalmente no STJ.
Segundo decidiu a Corte Especial do STJ, “a ação de improbidade administrativa deve ser processada e julgada nas instâncias ordinárias, ainda que proposta contra agente político que tenha foro privilegiado no âmbito penal e nos crimes de responsabilidade.” (AgRg na Rcl 12514/MT, Rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, julgado em 16/09/2013).RESUMINDO:
A) Não existe foro por prerrogativa de função em ações de improbidade administrativa (posição do STF e do STJ).
B) O STJ entende que os prefeitos podem responder por improbidade administrativa e também pelos crimes de responsabilidade do Decreto-Lei 201/67 (ex: REsp 1066772/MS).
A ação de improbidade administrativa contra os prefeitos será julgada em 1ª instância.
C) Para o STJ, os agentes políticos se submetem à Lei de Improbidade Administrativa, com exceção do Presidente da República.
Logo, é possível que os agentes políticos respondam pelos crimes de responsabilidade da Lei n.º 1.079/50 e TAMBÉM por improbidade administrativa, não ensejando "bis in idem".
D) Para o STJ, a ação de improbidade administrativa deve ser processada e julgada em 1ª instância, ainda que tenha sido proposta contra agente político que tenha foro privilegiado no âmbito penal e nos crimes de responsabilidade.
Logo, para o STJ, as ações de improbidade administrativa propostas contra:
• Governadores de Estado/DF;
• Desembargadores (TJ, TRF ou TRT);
• Conselheiros dos Tribunais de Contas (dos Estados, do DF ou dos Municípios);
• Membros do MPU que oficiem perante tribunais.
Devem ser julgadas pelo juiz de 1ª instância (e não pelo STJ).
E) O STF já decidiu, em 2007, que os agentes políticos sujeitos aos crimes de responsabilidade da Lei n.º 1.079/50 não respondem por improbidade administrativa (Rcl 2138/DF). Existe uma grande probabilidade de que a atual composição da Corte modifique esse entendimento.
F) O STF já decidiu, em 2008, que a competência para julgar ação de improbidade administrativa proposta contra Ministro do STF é do próprio STF (Pet 3211/DF QO).
9) O STJ tem reconhecido o cabimento de danos morais em ações de improbidade administrativa (REsp 960926/MG).
10) Os agentes públicos VITALÍCIOS (membros do Ministério Público, Magistratura e do Tribunal de Contas) também estão sujeitos a todas as sanções da LIA, INCLUSIVE à perda da função pública.
11) O Ministério Público, se não intervir no processo como PARTE, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei, sob pena de NULIDADE.
12) A medida provisória 703/2015 revogou expressamente a previsão do art. 17, parágrafo 1 da LIA (que proibia a celebração de acordo). Ressalta-se que há discussão sobre a constitucionalidade de tal MP. Logo, atualmente é possível ser afirmado o ACORDO de leniência.
Fontes
- Márcio André Lopes Cavalcante;
- Cléber Masson.
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