JUSTIÇA SEJA FEITA PARABÉNS AOS CORREDORES DO TJSP.
Órgão Especial
TJ-SP aplica penas duras a réus com prerrogativa
A
rigidez do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo com réus
que têm prerrogativa de foro teve episódios marcantes durante o mês de
março. Em três processos diferentes, o colegiado de cúpula do tribunal
condenou dois juízes e dois promotores de Justiça, todos em ações penais
e por crimes cometidos em decorrência de suas funções.
O primeiro
deles entrará para a história da Justiça paulista como um dos raros
casos em que foi aplicada a pena máxima para condenação por
prevaricação: um ano. Também ficará nos anais do Órgão Especial como “o caso do padeiro”. A condenação veio porque um juiz e um promotor entraram em conluio para prender, ilegalmente, um homem e favorecer um amigo.
É
a história de um advogado em Espírito Santo do Pinhal que tinha um caso
com uma mulher casada. O marido, o padeiro, descobriu e, claro, criou
problemas para o casal adúltero. O marido foi até a faculdade em que o
advogado dá aulas, a Unipinhal, para tirar satisfações e, segundo a
acusação, fazer ameaças ao namorado de sua mulher.
Depois começou a
espalhar boatos e, conforme consta dos autos, difamar o advogado. Não
contava com o fato de o amante ter amigos em todas as áreas do Direito.
Entre eles, dois colegas de magistério, um promotor e um juiz — que
também é coordenador do curso de Direito da universidade.
Irritado
com a atitude do marido de sua namorada, o advogado procurou seus
amigos para saber o que fazer. O juiz, ainda segundo o processo,
convocou uma reunião informal com o advogado e o marido, e recomendou:
pare com a política de difamação ou será processado. Não parou, foi
processado. E preso.
O que chamou a atenção da Procuradoria-Geral
de Justiça de São Paulo foi a prisão de um homem aparentemente
inofensivo e por difamação — crime de menor potencial ofensivo. Foi
aberto um processo de apuração. Descobriu-se que, em reunião particular,
advogado, promotor e juiz combinaram que, se a Promotoria abrisse
processo contra o padeiro traído, seria decretada a prisão preventiva. E
foi o que aconteceu.
Sem precedentes
Como se tratava de conluio entre juiz e promotor, foi aberta Ação Penal originária no Órgão Especial do TJ. Juízes de primeiro grau e membros do Ministério Público estadual têm prerrogativa de foro. Foram denunciados por prevaricação, crime descrito no artigo 319 do Código Penal.
Como se tratava de conluio entre juiz e promotor, foi aberta Ação Penal originária no Órgão Especial do TJ. Juízes de primeiro grau e membros do Ministério Público estadual têm prerrogativa de foro. Foram denunciados por prevaricação, crime descrito no artigo 319 do Código Penal.
Na
sessão do dia 20 de março, os desembargadores do Órgão Especial
seguiram o voto relator e condenaram os dois. Aplicaram as
circunstâncias previstas no artigo 59 do CP para majorar a pena ao
máximo. Seguindo o voto do relator, desembargador Ênio Zuliani, os
membros do Órgão Especial entenderam que, por mais que nem todas as
características do dispositivo pudessem ser usadas como agravantes, as
condições negativas pesaram mais no caso que as positivas.
O
artigo 59 do Código Penal diz que o juiz pode aumentar ou aliviar a pena
observando a conduta social dos réus, a personalidade, os motivos para o
cometimento do crime, as circunstâncias e as consequências do crime e o
comportamento da vítima. O desembargador Zuliani, cujo voto foi
complementado pelo desembargador Walter de Almeida Guilherme, afirmou
que a conduta social dos réus durante o processo não poderia ser usada
como agravante, mas todas as demais eram tão negativas que se
sobrepunham às positivas.
Os desembargadores Antonio Carlos
Malheiros e Grava Brazil divergiram do relator. Votaram pela condenação,
mas estabeleceram a pena em nove meses de prisão, já que uma das
circunstâncias do artigo 59 do Código Penal era positiva no caso dos
réus. Malheiros discordou com a tese de dar mais peso à consequência do
crime do que à conduta social dos acusados. Brazil também apontou para a
falta de precedentes para a aplicação da pena máxima pelo crime de
prevaricação.
Ambos os argumentos foram rebatidos. O relator, Ênio
Zuliani, afirmou que, de fato, são raros os casos em que se aplica a
pena máxima a condenados por prevaricação. Mas também afirmou que são
mais raros ainda, na história da Justiça paulista, casos semelhantes ao
do conluio entre o juiz e o promotor em Espírito Santo do Pinhal.
Almeida Guilherme completou que, caso não fosse aplicada a pena máxima,
decairia o prazo punitivo, e promotor e juiz não poderiam ser condenados
— nem retirados de suas respectivas funções.
O ciúme e o grampo
Na sessão desta quarta-feira (27/3), o Órgão Especial do TJ-SP também condenou uma juíza por interceptação ilegal de telefone, falsidade ideológica e denunciação caluniosa. Ela também havia sido condenada por prevaricação, mas o crime prescreveu. A pena ficou em cinco anos e quatro meses e em perda do cargo. O relator é o desembargador Guerrieri Rezende.
Na sessão desta quarta-feira (27/3), o Órgão Especial do TJ-SP também condenou uma juíza por interceptação ilegal de telefone, falsidade ideológica e denunciação caluniosa. Ela também havia sido condenada por prevaricação, mas o crime prescreveu. A pena ficou em cinco anos e quatro meses e em perda do cargo. O relator é o desembargador Guerrieri Rezende.
É
mais um caso misturando relações afetivas e membros do Judiciário. A
juíza, quando era titular na comarca de Cananéia, no litoral sul de São
Paulo, começou a namorar um advogado da cidade. O caso chegou à Justiça
em outubro de 2008, quando a juíza, enciumada, oficiou a então Telesp
Celular para que grampeasse o telefone celular de seu namorado.
A
ordem veio em papel timbrado com os símbolos da Justiça de São Paulo. O
grampo durou uma semana. No dia 6 de novembro de 2002, o departamento
jurídico da Telesp estranhou o ofício, que não fazia referência a
processo algum — não havia processo aberto — e pedia para que as
mensagens enviadas ao celular do advogado fossem enviadas ao seu
celular.
Insatisfeita com a empresa, a juíza expediu novo ofício,
no dia 12 de novembro, determinando novo grampo. E aí a operadora de
telecomunicações levou os documentos à Procuradoria-Geral de Justiça de
São Paulo. Foi descoberta a relação da juíza com o advogado, e ficou
configurado o crime de interceptação ilegal, conforme se depreendeu do
voto do relator, que foi acompanhado por unanimidade.
A juíza, no
entanto, alegou ter sido vítima de um plano maquiavélico do namorado. O
pai dele era réu em uma Ação Civil Pública por construção em terreno de
proteção ambiental e em uma Ação Penal por porte ilegal de arma. Ela
dizia que o então namorado só se aproximara dela por causa dos processos
em que o pai era acusado.
Verdade ou não, o fato é que ela
condenou o sogro na Ação Penal e determinou sua prisão no dia 16 de
outubro de 2003. No dia 20 de outubro de 2003, antes da publicação da
sentença, o advogado entrou com uma Exceção de Suspeição contra a juíza,
a essa altura ex-namorada. É nesse espaço de quatro dias que foi
cometida a falsidade ideológica, segundo a decisão do Órgão Especial.
Ela
recebeu a Exceção de Suspeição, arguida no dia 20, e determinou ao
serventuário da vara que publicasse a sentença com data retroativa ao
dia 16, antes da arguição de suspeição. Ela também mandou que o
serventuário emitisse um despacho retroativo ao dia 16 declarando-a
suspeita “por motivo de foro íntimo” para julgar a Ação Civil Pública.
Ou seja, fez com que a Exceção de Suspeição perdesse o objeto.
Entre
o grampo e a suspeição, a juíza denunciou o ex-namorado à Polícia.
Disse que ele a agrediu, a estava ameaçando de sequestro e que seus
filhos, por isso, estavam em perigo. Foram abertos três inquéritos
policiais, todos trancados por falta de provas. A falta de provas,
segundo Guerrieri Rezende, se deu porque tais fatos nunca aconteceram.
Ela fez as denúncias com o único intuito de causar transtornos à vida do
ex-namorado.
Ex-estagiário
Também na sessão da última quarta-feira foi julgado caso de um ex-promotor de Justiça de Catanduva que acabou condenado pelo Órgão Especial por concussão. A pena veio por ele ter favorecido um de seus acusados, cliente do escritório de um advogado que fora seu estagiário e que era sócio de sua mulher.
Também na sessão da última quarta-feira foi julgado caso de um ex-promotor de Justiça de Catanduva que acabou condenado pelo Órgão Especial por concussão. A pena veio por ele ter favorecido um de seus acusados, cliente do escritório de um advogado que fora seu estagiário e que era sócio de sua mulher.
Segundo a denúncia,
também feita pela Prouradoria-Geral de Justiça, o promotor deixou de
cumprir com várias de suas obrigações, e tudo em nome da amizade que
mantinha com o advogado. Violou, de acordo com o entendimento do Órgão
Especial do TJ-SP, a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, regras
do Código de Processo Civil e a Lei de Proteção Ambiental.
O caso
a que se refere a denúncia é uma Ação Civil por dano ambiental em que o
réu foi defendido pelo escritório do ex-estagiário do promotor. A
acusação data de 2006 e diz que o réu construiu um imóvel em área de
preservação permanente. O réu confirmou a responsabilidade pelo dano
ambiental e se dispôs a assinar um termo de cooperação para recuperação
da área.
Só que o promotor, em vez de pedir a transação penal (de
uma pena corporal para uma restritiva de direitos, já que houve acordo),
pediu o arquivamento dos autos. O relator da matéria, desembargador
Arthur Marques, entendeu que a petição para o arquivamento do caso é
normal, no caso, porque foi alegado que a região danificada já havia
sido reparada. No entanto, o promotor não exigiu comprovação da
reparação do dano. Levou em conta apenas o que foi dito nas audiências
pelo advogado, seu ex-estagiário.
A acusação foi de que o promotor
violou os artigos 252, inciso IV, e 258 do Código de Processo Penal,
bem como o artigo 43, inciso VII, da Lei Orgânica do MP. Os dispositivos
obrigam os membros do MP a se declararem impedidos quando tiverem algum
tipo de envolvimento com os denunciados.
O relator do processo
levou ao caso jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça segundo a
qual o grau de parentesco ou relação de amizade não é suficiente para
obrigar o juiz ou promotor a se declarar impedido. Mas também levou aos
autos que usar do cargo público para favorecer a si mesmo ou a outrem é
crime previsto no artigo 319 do Código Penal: concussão. A pena ficou em
três meses e 15 dias, cumpridos em regime aberto, com perda do cargo.
Ele já estava em disponibilidade desde 2009.
Processos:0075132-20.2010.8.26.0000 - caso do padeiro de Espírito Santo do Pinhal.
9027471-33.2003.8.26.0000 - caso da juíza de Cananéia.
0009006-56.2008.8.26.0000 - caso do promotor de Catanduva.
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