Páginas

sexta-feira, 1 de maio de 2015

ÀQUELES QUE AINDA SE INDIGNAM






Àqueles que ainda se indignam

Desce da forca, vem, banca o safado: e serás governador ou deputado

O mês de abril se foi. Para nós de Caraguá, bastante “proveitoso” em termos de feriados e dias de folga, registrando-se generosa movimentação nas atividades de turismo da cidade.

Ao que parece, foi tudo de bom. Mas... será?

Todos adoraram ficar à-toa no dia de Tiradentes, apenas porque, como feriado, seu significado tem sido apenas este mesmo. Já não se lembram mais das suas raízes, do seu sentido, de que um homem balançou na corda porque foi corajoso o suficiente para levantar sua cabeça e não aceitar aquilo que se lhe impunham, e pagou caro por sua ousadia.

Pagou com a vida.
                         
Hoje, fazem o que querem conosco. Contudo, já não se veem mais homens que valham o gênero, que carreguem dependurados culhões protegidos por escrotos verdadeiramente roxos, como o pobre Tiradentes, para ao menos tentar dar um “basta!” a este estado de coisas, insuportável já de há muito.

“Rouba, mas faz”, eis aí máxima do nosso conformismo, da nossa covardia, da nossa indiferença e falta de solidariedade diante da roubalheira escancarada que se perpetram por este imenso país, arrombando cofres públicos, que vai do município aos luxuriantes gabinetes de Brasília.

Cada centavo de imposto subtraído soa como que uma cusparada na cara de cada brasileiro. Daqueles brasileiros que, evidentemente, têm alguma vergonha na cara e ainda ruborizam quando se lhes esfregam nas bochechas relatos de corrupção explícita, como vemos agora, com a pilhagem e desmonte da maior empresa do país, a Petrobras, que ERA o orgulho nacional, por um grupo de saqueadores travestidos de partido politicamente organizado.

Quebraram a poderosa Petrobras. Por certo, ainda quebrarão o país.

A situação inspira repugnância tanta que até vale a pena plagiar um padre que, lá nos idos de 70, ousou, a sua maneira, levantar a cabeça e desabafar:

“Meu pobre Tiradentes, com uma pátria livre sonhaste. Que ingenuidade. Desce da forca, vem, banca o safado. E serás vereador, prefeito, secretário, governador, presidente, ministro, senador ou deputado.”

Abaixo, apresentamos o texto no seu original, para que se reflita neste dia de Tiradentes, que passou apenas como mais um dia de folga.

ORAÇÃO AO TIRADENTES

Meu pobre Tiradentes, que imbecil!
Uma pátria sonhaste, livre, forte,
e acabaste na forca. O teu perfil
tão belo e puro, teu gigante porte
não foi feito pra terra do Brasil;
mísera terra desde o sul ao norte,
terra de bandoleiros e ladrões,
de velhacos, covardes e histriões...

Meu Tiradentes, quanto nojo, quanto,
entra-me n’alma e o coração me enjoa,
quando vejo aclamando-te por santo
uma turma de hipócritas à toa...
Põem-te em pedestal granítico, entanto
a fé que tu pregaste abandonou-a,
trocando por uns sórdidos vinténs
a chama do ideal que tu entreténs...

O ínclito dragão, simples que tu és!
julgas que é nobre estertorar num laço,
estrebuchando da cabeça aos pés –
macabra dança que envergonha o espaço –
pra que depois uns sujos lhagalés,
escória da nação, fezes, bagaço
do povo, venham insultar tua glória
dizendo ovacionar tua memória.

Meu santo alferes, que estultice a tua!
Inda acreditas em patriotismo?
O cadafalso deixa, vem à rua:
verás o tétrico, o imenso abismo
de lodo e podridão onde flutua,
como estandarte porco do cinismo,
um pedaço auriverde da bandeira
que já abençoou a plaga brasileira...

Meu puro Tiradentes, o sarcasmo
cruel enxovalhou-te nome e fama.
Mais que da morte no tremendo espasmo,
sofre tua alma ao chafurdar na lama
de opróbrios e baldões, que só o orgasmo
dos teus algozes sádicos reclama...

Mas te conforta a oração do monge
e a pátria livre que tu vês ao longe...
Pátria livre? Ilusão! Engano atroz!
Hoje, seus membros fortes encadeia
a sina dos escravos. Chora a sós,
e grita e impreca. Alucinada alteia
em desespero a sólida voz:
responde o soluçar da patuléia...

Os grandes, o Governo, os ‘patriotas’
cospem na cara dos plebeus idiotas...
A pátria escrava! escravizou-a a gula
insaciável, a feroz cobiça
de tubarão, a que o governo açula,
tentando-o com os restos da carniça,
que na estrada deixou essa matula
de políticos vís, que vão à missa
da deusa Pátria, de manhã e, logo,
a pátria esquecem ou lhe deitam fogo...

Pátria que amaste e que infeliz, eu vejo
vendida ao nobre rico e ao burguês,
vendida no atacado e no varejo,
a todo e qualquer tipo de freguês,
por gente sem escrúpulos, sem pejo,
com pago à vista ou em prestações por mês...
Pátria em que o dinheiro e o suborno e as trutas
fazem reinar até as prostitutas...

Pátria em que da justiça a virgindade,
ao poluir-se em fétido bordel
de traições ao Direito e à verdade
negando a luz, afunda no marnel,
sem que ninguém de seu revés se apiade!...
Anjo de Deus, comprado por Lusbel,
ouve no charco sonorosas palmas,
que pedem bis à podridão das almas...

Pátria, à qual serviu o imortal Caxias,
e que o exército jura idolatrar,
pétreo gigante de Gonçalves Dias –
‘fronte nas nuvens, os pés sobre o mar’ -
é hoje imolada em nebras orgias,
atrás de um balcão, erguido em altar...
Repasto de abutres, lobos, chacais,
ai! morre esperando os seus generais...

Pátria sim? Ora, a pátria! que me importa
um nome que inventaram tão sonoro,
se anda a fome a rondar a minha porta
e há goteiras na choça em que demoro,
se o sol me queima e, frio, o vento corta,
se pra viver a caridade imploro?

Às favas uma pátria que é madrasta,
onde o ter co’o ter demais contrasta!
Pátria sim? Ora, a Pátria! Quanto ganha
quem serve a Pátria, ou vai morrer por ela?
Pátria é a adega, é a taça de champanha,
é na mesa caviar, serra da estrela,
Reais aos milhões, Paris, Espanha,
bela mulher com – para entontecê-la –
música, vinhos, carros, jóias, praia...
E que ao redor o mundo inteiro caia!

Meu Tiradentes mártir, hoje em dia,
neste século vinte e um progressista
não há, nem pode haver filosofia
que à lógica do estômago resista.
Heroísmo é excrescência, é anomalia,
sem sentido no credo epicurista...
Desce da forca, vem, banca o safado:

Serás eleito governador ou deputado!


Nenhum comentário:

Postar um comentário

contador extra - desde 04/9/11 - 16:23h

contador extra2